Eles são analistas, bancários, comediantes e dentistas. Atuam em diferentes setores na sociedade, adoram viajar, ir ao cinema e ao teatro. Apesar de possuírem uma rotina como a de qualquer outra pessoa, os portadores de nanismo ainda enfrentam preconceito por onde passam e precisam provar sua competência diariamente. Vamos entender mais sobre esse transtorno e conhecer a trajetória de Adimir Scudiero, servidor público há mais de vinte anos em Vacaria
Apesar de parecer não ser tão comum encontrar pessoas com nanismo pelas ruas, estima-se que existam no país mais de vinte mil anões, segundo pesquisa da Veja.
O nanismo é um transtorno que se caracteriza pela deficiência no crescimento, resultando numa pessoa com baixa estatura, se comparada com a média da população de mesma idade e sexo. Os homens adultos chegam a uma altura máxima de 1,45 metro e as mulheres não alcançam 1,40 metro, em média.
O que muitos não sabem é que mais de duzentas condições diferentes podem alterar o ritmo do crescimento. Uma das mais frequentes é o nanismo, que é classificado em duas categorias distintas: Hipofisário ou Pituitário (causado por distúrbios metabólicos e hormonais) e Acondroplasia (síndrome genética que impede o crescimento normal dos ossos longos).
Anão é um termo popular, criado para descrever pessoas pequenas. Hoje vamos conhecer a história de um, que já virou personalidade em nossa cidade. Adimir é conhecido nos quatro cantos de Vacaria e divide conosco os obstáculos que enfrentou pelo caminho em sua vida privada e social.
Fonte: Biblioteca Virtual em Saúde
É difícil que alguém em nossa cidade não conheça Adimir Gotardo Scudiero. Com sua pouca estatura, mas grande eficiência e simpatia, Adimir trabalha há vinte e seis anos na Prefeitura Municipal de Vacaria, provando que competência não depende de tamanho.
A história dessa personalidade vacariana, começou há quarenta e nove anos atrás, quando ainda na barriga de sua mãe, o médico avisou que o bebê nasceria com deficiência física. “Nasci com o pé esquerdo virado e precisei passar por uma cirurgia, ainda criança, para correção. Venho de uma família muito humilde e sem histórico de nanismo”, explica.
Adimir começou a estudar tarde, com quase dez anos de idade. Isso aconteceu pois ele morava em um sítio, no interior, e precisava caminhar 1km e meio para conseguir pegar o ônibus que levava para a escola. Apesar de toda a dificuldade de locomoção e transporte, Adimir tornou-se o CDF da turma e nunca rodou, tomando gosto pelos estudos.
Nesse período de sua vida, ele nos conta que foi onde sofreu mais bullying e preconceito, já que as outras crianças, notando sua diferença física, faziam muitas piadas e brincadeiras de mau gosto. “No colégio me colocaram dentro de uma lixeira e me jogaram no corredor. Essa passagem, entre tantos outros momentos de preconceito pelos quais passei, foi uma das que mais me marcou”, relembra.
No ensino médio, além da escola regular, ele começou a fazer cursinho pré vestibular. Passou para Tecnologia e Processamento de Dados, na cidade de Lages, indo e voltando todos os dias, até formar-se tecnólogo.
Sua trajetória na Prefeitura começou quando ficou sabendo que na Secretaria de Saúde estavam precisando de um digitador. Aplicou-se para a vaga e passou a redigir as Fichas de Atendimento Ambulatorial de todas as Unidades de Saúde da região. Até que prestou concurso público e foi efetivado em 1996. “Sempre vesti a camisa e me esforcei em todas as minhas atividades, para ser bom o suficiente. Me tornei gerente de TI e fiquei nesse cargo por mais de vinte anos. Fiz curso de banco de dados, de atualização de servidores, e estou sempre em busca de inovação, pois esse setor de tecnologia nunca para”, comenta o profissional.
Um marco na sua história é que, em 2008, Adimir conquistou o terceiro lugar na Premiação Iberoamericana de Cidades Digitais, onde mais de doze países participaram. Há poucos meses, Adimir foi transferido para a Receita Federal, onde também está desenvolvendo um excelente trabalho.
Depois de conseguir trabalho, a única coisa que faltava para Adimir ser completamente independente, era a questão da locomoção. Com pouco recurso financeiro comprou seu primeiro carro, um Uno usado, assim que foi efetivado no emprego. E aí deu-se início ao período mais burocrático da vida de Adimir. “Temos uma grande falha no sistema. Para um deficiente tirar a carteira de motorista, ele precisa fazer o inverso: primeiro compra o carro, manda adaptar, e só depois pode procurar uma auto escola, já que as aulas práticas e a prova, tudo vai ser feito com o automóvel do aluno”, afirma.
Para a adaptação do carro, é preciso que um engenheiro mecânico projete o veículo de acordo com as necessidades especiais daquele motorista em específico. A adaptação precisa passar pelo INMETRO, além de correr atrás de seus benefícios e isenções. “Foi muito burocrático, tive que comprovar tudo, buscar uma declaração de capacidade no INSS, além de termos restrições de valor máximo na compra do carro”, diz ele. No caso de Adimir, foi preciso mexer na elevação de banco, apoiador de pé, pedais e câmbio.
Com quase meio século de vida, Adimir, mais do que nunca, busca cuidar de sua saúde. Com problemas sérios na coluna e sem tratamento existente, o pequeno grande vencedor é uma incógnita para a medicina, já que os médicos não entendem como ele ainda está caminhando e sem fazer uso de cadeira de rodas.
Seguidamente, Adimir tem seu lado esquerdo inteiro do corpo amortecido, e ainda diz ter sorte por não sentir dor. Devido ao desgaste nos joelhos, visita sempre o nutricionista e cuida da alimentação para não engordar e prejudicar ainda mais suas articulações.
Há alguns anos atrás, sofreu com uma depressão severa, que acarretou ansiedade, estresse, e uma fase ruim que marcou sua trajetória. “Passei por muita coisa na vida, até que um dia meu psicológico não aguentou. Fui no fundo do poço para descobrir que precisava de ajuda. Desde então faço acompanhamento, tomo meus remédios e tento manter minha mente limpa e organizada. Tenho sorte de também poder contar com bons amigos que sempre estiveram ao meu lado”, diz ele, agradecido.
Sobre piadas inapropriadas, olhares de julgamento e preconceito, Adimir é direto e seguro em sua opinião. “Quem tem deficiência já sabe disso, portanto, ninguém precisa potencializar a questão. Acho que tem certas brincadeiras que não são mais aceitáveis nos dias de hoje, assim como penso que minha idade não permite que eu engula algumas atitudes que julgo erradas. Tenho direito de ir e vir como todo mundo, dentro das minhas limitações. A verdade é que ninguém é perfeito”, conclui.
Hoje em dia, alguns locais públicos já possuem a obrigatoriedade de acessibilidade, podendo levar multa caso não preencha os critérios impostos por lei. Porém, em locais privados, nota-se que não há muita preocupação em atender as necessidades especiais de deficientes físicos.
Adimir conta que ainda sente muita dificuldade para usar caixas eletrônicos e que vasos sanitários e pias para pessoas de baixa estatura são quase inexistentes. “O que me ajuda muito, e aos amigos cadeirantes também, são as rampas que tem em todos os bancos e o balcão baixo que os Correios dispõem. Fora isso, nossa vida social torna-se bem restrita e tudo é de difícil alcance”, lamenta.
Em centros grandes, cidades maiores e capitais, locais como os shoppings, já se tornaram acessíveis aos diversos tipos de públicos e esperamos que isso seja uma tendência para que todas as pessoas sintam-se assistidas e capacitadas a ocupar diferentes locais da sociedade.