O ato de adotar está entre um dos mais lindos e solidários do comportamento humano. Muitas crianças e adolescentes conseguem, na adoção, enxergar um novo horizonte para suas vidas que, antes de irem para esse lar repleto de amor e carinho, tinham uma triste realidade e sensação de abandono. Então, vamos ler histórias sobre o tema, de vacarianos que adotaram e foram adotados, e que hoje tem o coração cheio de esperança por conta desse ato louvável
Hoje no Brasil, estima-se que haja mais de sete mil crianças e adolescentes esperando por um lar. O número parece gigante, mas o que muitos não sabem é que estão na fila de adoção, ansiosos por um filho, mais de trinta mil pessoas, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.
Mas então, se há mais pessoas querendo adotar, do que crianças para serem adotadas, porque esse problema não é solucionado? A grande questão está nas exigências dos pretendentes, que ao preencherem a ficha com seus dados e o perfil da criança que desejam, optam, em sua maioria, por pele branca, de 0 a 4 anos. Outro requisito que atrapalha o processo, é o de adotar crianças sem irmãos, já que é previsto por lei que eles não sejam separados. Ou seja, o perfil desejado, normalmente não é compatível com aquele disponível nas instituições de acolhimento.
O tema adoção em nosso país, ainda é dificultoso e, por vezes, se torna um caminho árduo para quem quer adotar, e quem quer ser adotado. Só conseguem aqueles que não possuírem irregularidades durante o processo, garantindo uma adoção responsável, legal e para sempre.
Infelizmente, ainda existe um preconceito enraizado na sociedade, que defende a ideia de que filhos não biológicos, não possuem o mesmo pertencimento à família, do que os gerados no próprio ventre da mãe. E é por isso que vamos ler histórias de famílias que provam exatamente o contrário, mostrando que tudo ficou completo e feliz, após o ato louvável da adoção em suas casas.
Eudes Dallabarba é natural de Espigão Alto, município de Barracão, e veio com vinte anos morar em Vacaria. Porém, até chegar em nossa cidade, sua história de vida teve uma reviravolta e tanto. Ele nos conta que naquela época, não existiam as adoções como são feitas hoje em dia, com fila de espera, acompanhamento e toda a burocracia que conhecemos. O que acontecia é que, as famílias com um grande número de crianças, doavam seus filhos para casais que não podiam engravidar.
Então, foi exatamente isso que aconteceu. Seus pais biológicos, Ângelo Benevenuto Dallabarba e Trindade Francisca Dallabarba, já falecidos, escolheram Eudes entre seus cinco filhos para doar a um casal que queria companhia em casa, ajuda na roça e, o principal, gostariam de ter a chance de dar amor e passar seus ensinamentos de vida para alguém.
Com seis anos, o pequeno foi morar com Getúlio Vargas de Abreu e Zenaide Lira de Abreu na cidade de São José do Ouro.
“Me lembro que quando me falaram que eu teria que sair de casa e abandonar meus irmãos, eu saí correndo me esconder. Meu pai legítimo me convenceu a pelo menos conversar com o casal que queria me adotar e assim foi. Acertaram tudo e no outro dia meu irmão mais velho foi me levar para a nova casa”, recorda.
Chegando lá, Eudes foi alimentado e levado direto para trabalhar na roça. Ao retornar para casa de noite, teve uma conversa decisiva com Getúlio. “Meu pai de criação me olhou e disse: daqui pra frente, eu sou teu pai, ela é tua mãe, nossos irmãos são teus tios e os filhos deles são teus primos”, afirma.
Eudes recebeu uma educação valiosa, amor, atenção e até desenvolveu seu dom natural para música, já que seu pai de criação tocava em conjuntos de baile e o fez aprender bateria e gaita. “O pai me fazia levantar às 4h da manhã, inverno e verão, para ensaiar com ele. Aos dezesseis anos, já estava tocando baile e o acompanhando em diversos eventos”, completa.
A vida de músico foi o que os trouxe para Vacaria. O mercado aqui era muito melhor para os grupos nativistas que queriam se destacar. Os anos foram passando, Eudes casou-se com Rosane Souza Dallabarba, e o casal hoje têm duas filhas, Larusa e Amanda. A mais nova tem oito anos e é adotiva, motivo de orgulho e realização em suas vidas.
“A Amanda é um verdadeiro presente na nossa casa. Ela veio para nos ensinar, nos unir e mostrar que para ser uma família de verdade, só precisa ter amor”, diz Rosane.
Larusa, a filha mais velha, é casada com Tarciso Molon, os quais recém tornaram-se pais da Ana Gabriela, também adotiva. O casal ficou longos cinco anos na fila de adoção, passaram por todos os processos requeridos, até que a ótima notícia chegou. “Depois que estávamos oficialmente na lista de espera, meu marido foi todos os finais de ano no fórum, perguntar se eles tinham alguma esperança em relação a vinda de uma criança. Por isso, quando o telefone tocou, a emoção foi incontrolável”, lembra Larusa.
A Ana veio com um ano e dez meses e, para surpresa de todos, os traços físicos eram exatamente a mistura das características dos pais: pele morena e olhos verdes. Depois de passarem pela adaptação e estarem liberados para levarem sua filha para casa, a vida do casal mudou completamente e, a partir de então, toda a atenção e os olhares se voltaram para a pequena.
Essa família, que conta com três casos de adoção, é mais uma das inúmeras famílias brasileiras que comprovam que o amor é maior que tudo, inclusive que os laços de sangue. Mas é nas palavras de uma criança que a adoção se explica. “O médico abriu o coração da mãe, do pai, de todo mundo, e me colocou lá dentro”, diz Ana Gabriela, hoje com três anos e sete meses.
No caso da família de Cecília Radatz, a adoção fugiu do padrão brasileiro. A professora de ciências humanas, que reside em Vacaria, mas leciona em Muitos Capões, estava casada há quase cinco anos com seu marido Gildomar Voigt Radatz, quando resolveram entrar na fila de adoção. Ao ir no fórum preencher a ficha, selecionaram a opção de uma criança de 0 a 4 anos, que é sempre o mais comum entre os casais. Porém, o senhor que lhe atendeu comentou que havia uma adolescente, de treze anos, que estava disponível para adoção.
Após pensarem por algum tempo, voltaram ao fórum e tomaram a decisão de levá-la para casa. “Ouvimos muitas opiniões contrárias, preconceituosas e desanimadoras, pois todos ficam com um pé atrás quando se trata da adoção de adolescentes. Porém, somos de família cristã, e acreditamos que não estaríamos onde estamos hoje, senão fosse pela criação que recebemos. Então, nada mais justo do que ofertar a chance de um futuro melhor para outro ser humano”, comenta Cecília.
Rapidamente, Sandra Vitória estava em sua nova e permanente residência. Ela já tinha uma história, onde não havia nenhuma estrutura familiar, que deixou muitas marcas e que não a permitiu viver todas as fases de sua vida. Sandra não entendia obrigações básicas logo que chegou na casa da família adotiva e declarou ter sido muito difícil toda a adaptação.
“Estive no lar com meus quatro irmãos, que foram adotados por outras famílias, durante seis anos. Para mim, aquele lugar se tornou a minha realidade. Então, quando soube que me adotariam, fiquei feliz, mas ao mesmo tempo senti um estranhamento, pois teria que me adaptar novamente”, relembra a filha.
Aos poucos, Sandra foi se ambientando, num processo lento e gradativo. Hoje, com dezoito anos, a jovem estuda no Instituto Federal e pensa em prestar vestibular para o curso de medicina.
Os pais decidiram continuar na fila, já que tinham preenchido os papéis para adoção de uma criança pequena na época da chegada de Sandra. Foi quando, três anos depois da primeira adoção, o telefone tocou e era a vez de integrar-se à família Gildomar Júnior, um menino lindo e esperto, com dois anos de idade. “Na primeira visitação, ele já nos chamou de papai e mamãe. Ele é mais uma criança vítima de abandono, que foi deixado no lar com dezessete dias. Para nós, era a peça que faltava no quebra cabeça da nossa família”, relata Cecília.
Como todo irmão, Sandra e Gildinho brigam bastante, disputam pela atenção dos pais e são companheiros inseparáveis em todos os momentos. O quarteto ainda conta com a ajuda diária da avó materna, dona Zelinda, que cuida do neto mais novo para os pais poderem trabalhar.
“Eles não nasceram de nós, mas nasceram para nós. Sempre fomos uma família, só faltava nós nos encontrarmos”, finaliza a mãe orgulhosa.